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O tempo está na grama alta, sem data a ser cortada. O tempo está na página do livro antigo que rasga quando dobrada. O tempo está no atravessar vagaroso ou apressado da rua. O tempo está em um suspiro no qual me alongo quando penso no futuro. O tempo está na marca interna que encostar o outro/ser encostada por ele deixa - será que vamos lembrar o não-poder-poder-encostar? Sinto-me privada das experiências, e o que é isso diante da fome e da morte? Sinto que comprimiram o tempo, sem perguntar a mim - ou a qualquer uma - se isso seria cabível. E tudo, que já era um instante, de repente, foge, e como eu quero aprender mais antes de ser algo. Privação da possibilidade de experienciar diante da compressão do tempo. Me tiraram a ampulheta, o relógio, e em algum dia achei que podia controlar alguma coisa que fosse. Aprendo com os instantes que fogem, quando abro os olhos está claro, e como perco o entardecer cotidianamente? O que será lembrado? Se o que eu sinto, o que percebo são emaranhados, nós, fios trançados desorganizadamente de tato e som e imagem, sem ordem, como queria poder pegar com a mão, acariciar os segundos, que se passam sem consultar a ninguém.
19 de março de 2021
Luana Papelbaum Micmacher
Psicologia - UFRJ
Sobre a autora: Sou Luana, estudante do 6º período de Psicologia na UFRJ, mergulhada no universo da mediação escolar no meio desse vai e vem de suspensão das aulas presenciais. Estou me conectando pela primeira vez de forma cotidiana com sujeitos infantis nesse lugar de estagiária e me vejo muito mobilizada pela sensação da evaporação do tempo, da sensação do descontrole, radicalizado pela pandemia, me deparando assim com o fato de que em nosso trabalho grande parte está totalmente fora do nosso alcance. Sofro com sensação de não dar conta de tudo. E assim acabei escrevendo esse paragrafozinho, e fiquei com vontade de compartilhá-lo aqui.
Arte por: Flora Dias.
Associada ao Núcleo Trabalho Vivo (NTV) – um grupo de ensino, pesquisa e extensão do Instituto de Psicologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), que desenvolve atividades ligadas à arte, ao trabalho e a ações coletivas, com enfoque nos processos de saúde e adoecimento – a Revista Fragmentos nasceu a partir da soma do anseio de divulgação artística/literária dentro do espaço acadêmico-formal, com a demanda de um contato mais direto das universidades com a sociedade e suas comunidades. Dito isso, o moto máximo da revista, inspirada na obra "Sopro de Vida" de Clarice Lispector, é: "Trabalhamos com o Inesperado". Esta frase não serve meramente de enfeite: nossa intenção é a circulação intra e extra acadêmica de arte e literatura afastada dos moldes clássicos e formais.
Nosso grande objetivo é a exploração de uma nova escrita acadêmica. Advogar por potências que julgamos não ser devidamente valorizadas dentro das universidades federais. Daí surge a ideia de um espaço onde haja o acolhimento desta outra escrita, mais afetiva e ressonante. Junto a este movimento, pensamos que um contato maior da população com o que se produz nas universidades é fundamental nos tempos em que vivemos. Ao deixar a linguagem técnica momentaneamente de lado em favor a essa outra escrita, vemos uma possibilidade ímpar de encontro entre autores (representado pelos estudantes) e público em geral.
A Fragmentos tem tanto seu lado formal de publicação com as publicações totalmente originais – crônicas, contos, ensaios, críticas literárias/cinematográficas/teatrais, desenhos, quadrinhos, pinturas, gravuras, fotografias etc. –, quanto um acesso mais direto através das redes sociais Instagram e Facebook, com conteúdo mais fragmentado – trechos/fragmentos de obras acadêmicas, recomendações de livros e textos, bastidores da UFRJ, divulgação de eventos culturais e palestras etc.
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