A fila até que não estava tão longa. Era curioso observar as expectativas, os olhares esperançosos e, especialmente, as risadas. É claro, também havia os tremores, os olhares apreensivos e, muitas vezes, os gritos de revolta. No momento em que o líquido na seringa foi mostrado a um senhor, seus olhos marejaram e de longe pude enxergá-los se fechando, a lágrima caindo, a agulha sendo injetada. Ele abriu os olhos e a gratidão reluziu, ao mesmo tempo em que uma espécie de suspiro triste aconteceu. Quase pude ouvi-lo dizendo a alguém: "Se tivesse sido antes, você ainda poderia estar aqui..."
Saiu mais leve do que chegou — mais aliviado, talvez — enquanto a próxima pessoa da fila era chamada.
Expressava um misto de euforia e inconformidade. Estava acompanhada e falava alto sobre as negligências e os absurdos. Seu acompanhante tirava fotos e parecia filmá-la enquanto o líquido era injetado e ela gritava: "FORA!".
Ao mesmo tempo em que pressionava o algodão em seu braço, trocou um momento de afeto caloroso com aquele que a filmava. O tempo pareceu parar por um instante. Era como se toda a euforia e a revolta que antes ocupavam o seu ser tivessem se transformado em quietude e conforto. Os dois saíram, trocando carinhos.
É a minha vez.
Não me sinto temeroso, nem animado. Talvez feliz, apesar de tudo. Estou acompanhado e peço para ser filmado. Por um momento, sinto-me como aquelas pessoas famosas sendo capturadas por paparazzi. Uma pontada em meu braço e pronto — passou. Daqui a três meses eu volto. Nós voltaremos, se tudo der certo. Há tanto a mudar e tanto a fazer. As existências corrosivas parecem finalmente dar lugar a algum tipo de reconstrução. E agora, pelo menos, consigo vislumbrar afetos e possibilidades de um futuro.
Eu só espero que este futuro possa existir para todos nós.
30 de maio de 2021
Felippe Del Bosco
Psicologia - UFRJ
Felippe ama pesquisar, cuidar e escrever. Ler, namorar, maratonar séries, jogar xadrez e tocar piano também sustentam a sua existência. Enquanto LGBT e PCD, valoriza a diversidade e a inclusão. Viver de poesia é um dos seus maiores sonhos (talvez ele já faça isso, mas não saiba).
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